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sexta-feira, 23 de outubro de 2009

défice

No que me toca, hei-de aproveitar ao máximo estas oportunidades excepcionais: uma das melhores coisas na minha faculdade é a frequência com que decorrem colóquios, conferências e debates sobre os mais variados temas, seja isoladamente ou em ciclos. Suponho e desejo que assim seja nas outras.

Hoje mesmo passei a maior parte do meu tempo num colóquio interessantíssimo, apercebendo-me mesmo que foi o dia em que mais aprendi ali. Com efeito, é-me muito agradável a oportunidade de estar com pessoas mais ou menos conhecidas a falarem sobre os assuntos que melhor conhecem, e ter no fim da sua oratória a oportunidade de lhes colocar questões, ou mesmo debater com elas os assuntos então visados.

No entanto, não pude deixar de me inquietar por ter sido o único do meu curso a estar presente – disto tenho quase a certeza –, sendo que não é a primeira vez que assim é. E por isto pergunto: o que é uma instituição de ensino superior? Qual o seu interesse e utilidade, a partir do momento em que temos uma adesão residual a eventos tão contributivos para esse “papel-chave” que é a transmissão e partilha de conhecimentos da parte do público a que se destinam – os estudantes?
Ora, em jeito de tentativa de solucionar este insensato problema só me ocorre algo, por mais ingénuo e até simplista que possa parecer: assim como temos um plano nacional de leitura, criarmos um plano nacional de literacia. Porque creio que insta encorajar o quanto antes este gosto pelos eventos coloquiais, por assim dizer. E já agora, porque não criar a rede nacional de organização coloquial, ou coisa do género, para levar "o conhecimento por via da palavra viva", dinâmica porque participada, às instituições de ensino. Mas também às de trabalho, saúde, tempos-livres, e de terceira idade. Afinal, não só a estudar se aprende. E mesmo estudar se aprende!

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

sábado, 10 de outubro de 2009

existencialidade

Desculpa-me desde logo o neologismo titular, que não resisto: é que acabo muito provavelmente de dar os meus primeiros passos no pathos da literatura existencialista (e quão tardios se me desprendem!). Ainda que não seja de agora que acredite que passamos grande parte da nossa vida a fazer as perguntas erradas pelos motivos certos – erradas, sim, porque as respostas, de tão fáceis porque evidentes, podem causar-nos grandemente essa dor a que chamo "sentir a consciência", e se traduz de facto em ter a consciência consciência si mesma. Até porque nós somos o que somos; e somos, para além do que, ainda o que queremos ser. E assim se explica porque nunca somos como queremos; e se percebe de igual modo como pensar diferente é estar iludido, pois que desde que somos que somos mais que o que queremos...
A ventura deu-se a propósito de um projecto pessoal a que me venho entregando aos poucos, e que levou o meu irmão a recomendar-me um livro que devorei com prazer nestes três dias. O autor era-me um perfeito estranho, apesar de me soar familiar o seu nome e o da obra em causa, de qualquer modo. Não tenho dúvidas de que seria interessantíssimo, profundamente didáctico voltar a fazer dela estudo obrigatório num 10º ou 11º ano de escolaridade, pois que me lhe senti essa falta...
Não farei nem um juízo que seja sobre a obra, pois tenho perfeita noção de que, tanto valendo per se, nenhum valor acrescentado lhe poderia ser por algum meu comentário. Eis apenas uma citação, estimulante, para meditares,

«Quem é fiel a uma certeza e a pode ver quando lhe apetece? A fidelidade é então só teimosia ou cedência à parte convencional da “nobreza de carácter”, da “honradez”. Não é isso, não é isso que eu quero.»
Alberto in Aparição, Vergílio Ferreira, 1959



sexta-feira, 2 de outubro de 2009

agastamento

O 5 de Outubro está a chegar uma vez mais e a nossa República faz 99 anos enquanto “regime mais que in facto”, por assim dizer. Ora, eu não sei se é por estar a ficar velhinha, mas… quer-me parecer que anda frouxa! Aliás, tanto o anda que vezes há que mais parece que estamos numa República, sim senhor, mas de bananas. Ou pelo menos assim sou levado a pensar por factos mais ou menos recentes como sejam a recente ascensão a terceiro lugar no nosso parlamento do CDS-PP, partido que é quase que disfarçada, sonegadamente até, pela não laicidade estatal (democratas-cristãos, recordo) – valor a que nos acostumámos desde 1911, e que, como já referi no post anterior, a meu ver é tão extraordinariamente necessário quanto indispensável ao bom funcionamento das nossa instituições políticas –, ou ainda por declarações como a que o Presidente da República fez há dois dias, a propósito do caso das escutas. Falarei agora apenas deste último.
Antes de passar ao tema, e só mesmo para que conste, dizer desde já que há coisas que não deveríamos mesmo ter de escutar. Pelo menos de certas pessoas, mais que não fosse pela esperada seriedade das funções que empossaram. As palavras do nosso magistrado superior não me convenceram de todo: porquê, então, demitir o seu assessor antes de se pronunciar, e porquê não se pronunciar antes das eleições, tendo plena consciência que iria prejudicar sobretudo o “seu” partido, o PSD? É que, como veio agora dar a entender, afinal até concordará com o primeiro-ministro quando este havia nomeado o caso “disparate de Verão”. Ah, mas espera: descobriu-se um e-mail de Abril de 2008! Que aborrecido, senhores governadores da República Portuguesa!
Bom: e enquanto tudo isto, espanto-me, pude ainda confirmar a minha suspeita de que o PSD não é definitivamente um partido familiarizado com os ditas novas tecnologias: se Ferreira Leite já tinha vindo admitir-se pouco à vontade com o “PowerPoint” das câmaras, Cavaco Silva veio agora confessar em público ter perguntando a si mesmo se seria possível o seu electronic-mail presidencial não ser seguro… Que raio de modernidade esta a que Portugal chegou com a República, em que o P.R. desconhece essa realidade contemporânea generaliazada que dá pelo nome de pirataria informática! Definitivamente, é por estas e por outras que sou cada vez mais monárquico e menos republicano: então não é que começo mesmo a acreditar que estas coisas não aconteceriam com um bom rei? Pois se acontecem com um Presidente da República pretensamente bom… E mudaram os nossos antepassados de regime para isto! Ai se eles soubessem… Enfim: que momento chato da nossa futura história política e social, pois que virá a ser lembrado o quase centenário da implantação da República neste claramente vergonhoso contexto presente. (A propósito: sugiro que vejas o próximo Câmara Clara, esse programa da RTP2 de valor incalculável, e que este domingo me promete assaz interessante.)
Mas tenhamos esperança no futuro imediato, e não diminuamos o acontecimento. Além do mais – e parece-me oportuno atentar agora no feliz progresso que tal representa – lembremo-nos que o Homem já consegue viajar no tempo em matéria de tratamento da roupa. Apesar de nem sempre o conseguir garantidamente, também há que dizê-lo. Porém uma coisa é certa: o tira-nódoas, quando bom, é um produto milagroso, digno de idolatria e até da mistificação, porventura – seja pela rapidez do seu efeito como pelo efeito em si, reconstrutor e purificador. Pois então digo eu: que venham outros "tira" sempre que necessário; mas de bem, para bem de Portugal!