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terça-feira, 9 de junho de 2009

demonstração

Creio que o riso é uma das melhores formas para julgarmos, conhecermos uma pessoa. Aliás, muitas vezes está presente no primeiro contacto.
Se pensarmos um pouco, facilmente percebemos que o sorriso, mais até que o riso em si, é como uma impressão digital: não obstante ser único, a sua individualidade não deixa contudo de ser categorizável, isto é: tal como as várias impressões digitais podem ser agrupadas em arcos, verticilos e presilhas (ou curvas), também os sorrisos podem ser desde logo agrupados como genuínos ou forçados, verdadeiros ou falsos, sentidos ou contidos. Curiosamente poder-se-á dizer que a semelhança entre o riso e a impressão digital chega ao ponto de, como as pessoas que sofrem da estranha patologia de Nagali e por isso têm as pontas dos dedos lisas, também haver pessoas que dificilmente se riem, e/ou quando o fazem aparentam fazê-lo de modo invariável, qual conversa em tom monocórdico, não desnudando eventualmente o que lhes vá na alma.
Ontem, como noutros dias da minha vida, ouvi pessoas rirem-se por malícia de algo ou alguém. De mim, possivelmente. E tal leva-me a reflectir: que outra forma há mais adequada, então, para formarmos o nosso juízo sobre o carácter das pessoas com que privamos – ou privámos –, que não o conhecimento das motivações do(s) seu(s) riso(s)? Até porque um problema que não se põe nestes casos é que bem e mal acabam por originar risos reconhecivelmente diferentes.
Desejo a quem ri por mal dos outros que… passe mais tempo a rir de si próprio, porque não raras vezes há em que mais engraçado isso é! =D

vergonha

Sou português, mas também europeu. Nasci em 1990, mas os meus 18 anos, quase 19 na verdade (se é que faz alguma diferença de todo), não me impedem de sentir desgosto de ter nascido numa parte do mundo que parece nunca ter sabido muito bem o quer para si politicamente. Com uma abstenção em Portugal cujo triste valor – 62,54% – se aproxima perigosamente do da média europeia – cerca de 65% –, não é caso para menos.
A minha consciência permite-me considerar com solidariedade todos os portugueses e europeus que não puderam votar por motivos de força maior e gostariam de o ter feito, mas obriga-me também a condenar todos os que não foram manifestar a sua atitude política às urnas. E que acabaram, no fundo, por dar a grande vitória das eleições a esse seu movimento absentista ridículo.
Como é possível que haja pessoas que não se interessam em (ir) votar? Acaso não têm noção que tal, mais que um direito constitucional, é um dever ético e de cidadania? Logicamente que é por completo preferível ir abster-se na urna a abster-se de lá ir. Esta recusa da maioria das pessoas a dizerem de sua justiça ao negarem o animal político que Aristóteles terá reconhecido em cada uma delas, no fundo à semelhança das que como eu votam, naturalmente… é condenável.
Apesar de particularmente manifesta em eleições europeias – e agora focar-me-ei apenas em Portugal –, a abstenção é um fenómeno que, qual doença crónica grave, vem afectando os portuguesas desde o tal 25 de Abril de 74 por que tantos homens e mulheres ansiaram. Mais estranho se torna, se pensarmos que uma das coisas que previamente se lamentava era precisamente a ausência de uma democracia representativa, legitimada justamente por via sufragista; ora eis-nos aqui, 35 anos depois (e ainda), a agir de forma tão pouco democrática – tão mais egoísta. E reconheço que aqui de pouco serviria provar a essas pessoas por meio de uma ditadura política que tenho razão, pelo simples facto que a minha razão é completamente independente das suas.
Pessoalmente dei-me ao trabalho de percorrer cerca de 500 quilómetros no passado fim-de-semana para votar. Não pus sequer a hipótese de não o fazer porque para mim não se trata de mera opção cívica – é mais, e sobretudo, um natural imperativo de consciência. Porque só eu tenho o poder regimental para depositar a minha confiança em quem quero que me represente no exercício do Poder, logo é irracional da minha parte que não o faça. Assim como acredito ser da parte de quem deliberadamente o não faz: é que os animais também não votam, e eu quero acreditar que Aristóteles tinha razão em relação à generalização anormalmente animalesca que imprimiu ao “bicho homem”.